segunda-feira, outubro 19, 2009

Agravamento da Tributação das Mais-Valias Bolsistas sem Consenso

A proposta de aumento da tributação das mais-valias bolsistas, feita no Relatório do Grupo para o Estudo da Política Fiscal, reabriu uma guerra que ainda está fresca na memória dos portugueses.
Para uns é uma questão de justiça, para outros, uma penalização que vai recair apenas sobre os pequenos investidores, existindo o risco de fuga da indústria financeira para outros mercados e de o pequeno mercado português encolher um pouco mais.
Depois de uma tentativa frustrada, em 2000, de tributar as mais-valias bolsistas em 20 por cento, acabou por ser implementada a tributação para pessoas singulares residentes de 10 por cento sobre os ganhos obtidos com a venda de acções detidas há menos de 12 meses, ficando isentas as detidas por períodos mais longos.
O grupo, apesar de salvaguardar a necessidade de realização de "um estudo sério" - reconhecendo que "é um dos sectores mais permeáveis à concorrência fiscal internacional, pois que é fácil a deslocalização das operações tributáveis" -, avança com uma proposta de tributação de 20 por cento para todas as mais-valias bolsistas, independentemente do período de permanência das acções em carteira.
A tributação de 20 por cento é o que o Estado aplica às rentabilidades dos restantes produtos de poupança, como os depósitos bancários, com um risco muito menor que as aplicações em bolsa. Os autores do texto defendem que o actual sistema acaba por deixar de fora boa parte das mais-valias geradas pela via do investimento do mercado. E vão mais longe: "A perda de receita e a redução da equidade e da eficiência fiscal parecem-nos bem mais importantes do que um suposto factor de apoio ao mercado de capitais." No relatório é dado o exemplo de Espanha e do Reino Unido, onde a tributação é de 18 por cento sobre todos os ganhos, alegando que os respectivos mercados "não se ressentem" dessa carga.
Não estaremos a falar de realidades diferentes? O presidente da Euronext Lisboa defende que sim. A sociedade que gere a bolsa portuguesa pede estudo sério, que tenha em conta "as debilidades do nosso mercado". Athayde Marques teme que um aumento da tributação provoque "uma fuga da indústria financeira nacional, uma quebra na liquidez e uma fuga dos investidores internacionais". O responsável lembra que um aumento da tributação "não é neutro" e, "se não existir um mercado de capitais dinâmico, o Estado também não tem onde ir buscar receitas". "Corre-se ainda o risco de penalizar os investidores particulares residentes, porque os grandes investidores institucionais podem aproveitar sistemas fiscais mais competitivos, através da criação de veículos para fazer as suas transacções", acrescenta. Valentim Martins, director da Caixa BI para o segmento accionista, e o presidente da Associação Portuguesa de Corretores, Garcia dos Santos, também vêem riscos no aumento da tributação dos ganhos bolsistas. Lembram que há anos de ganhos e outros de perdas.
Já Ricardo Sá Fernandes, antigo secretário de Estado de Pina Moura - que em 2000 tentou introduzir a tributação em 20 por cento, medida revogada antes de entrar em vigor - acha que a medida perde por tardia. Admite que haverá uma "enorme resistência à sua introdução", mas defende que um sistema fiscal justo não pode deixar de fora esta matéria. Também João Duque, economista e professor do ISEG, considera que se trata de uma questão de justiça fiscal, admitindo, no entanto, que se deve ser razoável em relação ao valor da tributação (não passar de zero a 20 por cento).
Dada a reduzida dimensão da bolsa portuguesa, quer a administração da Euronext quer o presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) têm pedido ao Governo medidas, incluindo de ordem fiscal, que incentivem a entrada de mais empresas em bolsa e a realização de mais operações no mercado.
Valentim Martins, director da Caixa BI para o segmento accionista, defende que ao nível dos investidores particulares fazia sentido criar benefícios fiscais para quem comprasse acções em empresas cotadas e não cotadas, numa perspectiva de médio e longo prazo (mínimo de cinco anos).

1 comentário:

advogado disse...

Pese embora concorde existir o perigo da fuga de capitais, não posso deixar de aplaudir esta proposta. Não existe, para além desse perigo, qualquer justificativo moral para que a obtenção deste tipo de rendimentos que, não advindo da criação de riqueza mas da mera especulação, não tenha de contribuir com as restantes para o equilibro das nossas contas.