segunda-feira, junho 07, 2010

A Tributação das Mais-Valias Mobiliárias

Com a grave crise económico - financeira como cenário de fundo e numa época de escassez de receitas públicas, nomeadamente as de índole tributária, o Governo decidiu avançar no sentido de uma maior arrecadação de receita (apesar do claro irrealismo da definição prévia de montantes a arrecadar).

Para isso, recentemente foi divulgada a Proposta de Lei n.º 16/XI, onde se plasmou a intenção do Executivo de introduzir um regime de tributação das mais-valias mobiliárias, alterando-se o quadro actual vigente.

Deste modo, a alteração da tributação das mais-valias mobiliárias assenta numa revogação da norma do Código do IRS – artigo 10. n. 2 - que previa uma exclusão da tributação quando a mais-valia fosse proveniente da alienação (o que excluía situações como a remição ou a amortização com redução de capital) de acções que fossem detidas por mais de 12 meses ou quando fossem obrigações e títulos de dívida (aqui aplicava-se a exclusão tributária independentemente do período de detenção).

Para, além disso, a alteração do quadro fiscal dá-se também ao nível da taxa especial (e não liberatória como por vezes é anunciado) e que é actualmente uma taxa de 10% aplicável às mais-valias tributadas (ex. quotas e acções detidas à menos de 12 meses). Assim, a nova taxa de tributação foi fixada em 20% e aplicar-se-á ao saldo positivo anual entre as mais-valias e menos-valias mobiliárias, resultantes das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.1 do artigo 10º do Código do IRS.

A Proposta de Lei apenas isenta de tributação, as situações relativas aos pequenos investidores que tenham um saldo positivo anual (entre mais e menos-valias) até aos 500 euros. Curiosamente esta isenção apenas se aplica na alienação de acções, obrigações e outros títulos de dívida, pelo que se mantém a tributação derivada da realização de mais-valias derivadas de outras partes sociais, instrumentos financeiros derivados (ex. opções), warrants autónomos e certificados.

Outro aspecto a assinalar resulta do facto de se pretender revogar o n.11 do artigo 10.º do Código do IRS. Esta disposição obrigava ao declarar das alienações onerosas das acções, ainda que excluídas de tributação. Nestes termos antevê-se que os pequenos investidores quando obtenham um saldo positivo anual até aos 500 euros deixem de estar obrigados à entrega do anexo g 1 – anexo destinado às mais-valias não tributadas.

A grande polémica desta Proposta advém da intenção do Governo em propor que estas alterações surtam efeitos desde o início do ano de 2010 o que suscita de imediato questões de eventual inconstitucionalidade dado o princípio fundamental da não retroactividade dos impostos previsto no artigo 103.º, n.3 da Constituição.

É claro que perante este quadro de agravamento tributário um dos caminhos assentará no recurso a Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS), porquanto estas mantêm no imediato o regime de exclusão nas mais-valias realizadas (para além da vantagem fiscal ao nível do recebimento de dividendos das participadas).

Refira-se por fim que o novo regime não afectará a isenção geral prevista no artigo 27.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais destinada aos não residentes tal como o Relatório do grupo para o estudo da política fiscal, competitividade, eficiência e justiça do sistema fiscal propunha.

Miguel Primaz
Advogado
Maio, 2010

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